top of page

Milton Hatoum: "Voracidade de empreiteiros não tem limites"

Atualizado: 14 de jun. de 2021

"Mais um crime contra uma das belas cidades brasileiras. A voracidade desses empreiteiros não tem limite".

Entrevista feita por Claudio Leal, originalmente publicada no Terra Maganize (28/01/2010) e disponível através do WayBack Machine.

O romancista João Ubaldo Ribeiro esqueceu as férias na Ilha de Itaparica e montou, na casa em que nasceu, um QG de resistência à construção de uma ponte sobre a Baía de Todos-os-Santos, anunciada pelo governador Jaques Wagner (PT). Um plano de expansão imobiliária é outra ameaça ao belo pedaço da costa baiana, diante do frontispício da primeira capital do Brasil, Salvador.

Depois de publicar a crônica "Adeus, Itaparica", um libelo contra os "sacerdotes de Mamon" (ídolo do culto à riqueza), Ubaldo ganhou a solidariedade dos escritores Luis Fernando Verissimo, Milton Hatoum, Jomard Muniz de Britto, Edson Nery da Fonseca, Fernando da Rocha Peres, Hélio Pólvora e Sonia Coutinho, do cineasta Cacá Digues, além de amigos, artistas, professores e intelectuais baianos. Nesta quinta-feira, o artista plástico Emanoel Araújo também assinou o manifesto "Itaparica: ainda não é adeus".

O governo da Bahia anunciou para breve o edital de "manifestação de interesse" na construção da bilionária Ponte Salvador-Itaparica, de 13km. O jornal A Tarde informou que as empreiteiras OAS e Odebrecht, dois dos maiores grupos brasileiros de engenharia civil, municiam o governo com anteprojetos.

Um dos escritores solidários a Ubaldo, o amazonense Milton Hatoum (autor de "Dois Irmãos" e "Cinzas do Norte") critica:

- Mais um crime contra uma das belas cidades brasileiras. A voracidade desses empreiteiros não tem limite.

Hatoum lembra também a construção da ponte sobre o rio Negro, de Manaus a Iranduba, orçada inicialmente em R$ 574 milhões, com recursos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

- Enquanto isso, Manaus cresce que nem um favelão, e nisso não é diferente de Salvador - completa o romancista.

Mário Cravo Jr.: "Se bela, por que não?"

O projeto da ponte baiana ganha o respaldo dos usuários insatisfeitos com o precário sistema de navegação marítima entre Salvador e Itaparica. "O ferry boat precisa ser desmoralizado pra poder a população ficar contra", acusa João Ubaldo.

O escultor Mário Cravo Júnior, 86 anos, precursor do modernismo na Bahia, prefere aguardar a divulgação oficial do projeto, mas defende "uma concorrência no mínimo nacional".

- Quero deixar antes de tudo evidente o meu respeito pelas opiniões dos artistas e intelectuais sobre uma possível edificação da ponte sobre a Baía de Todos os Santos, conectando Salvador e a Ilha de Itaparica - ressalva o escultor.

Desde a década de 1940, Mário Cravo tem uma presença de relevo na cultura baiana, como aglutinador do movimento de arte moderna, e conquistou projeção internacional com suas obras escultóricas. A ponte teria sua "aprovação do ponto de vista formal".

- Uma ponte sobre a nossa Baía de Todos os Santos, como todas as outras pontes sobre todas as outras baías na face da Terra, teria a minha aprovação sob o ponto de vista formal; ou seja, na solução criativa ou não desta ponte... No momento, opiniões pró ou contra uma ponte não me interessam, mas sim que solução foi apresentada até o momento como forma arquitetônica. Simplificando: se for uma bela ponte, por que não? - opina Cravo Júnior.

bottom of page