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Dois dias após aprovação na câmara, polêmico Plano de Mobilidade Urbana de Salvador é sancionado

Atualizado: 14 de nov. de 2022

Prefeitura diz que as medidas buscam uma melhoria da qualidade de vida e das condições para o desenvolvimento da capital baiana. Oposição afirma que plano não foi debatido com a sociedade. Por G1 BA


Postado no G1 Bahia

Decisão foi publicada na edição desta sexta do Diário Oficial do Município — Foto: Reprodução

O prefeito de Salvador, ACM Neto, sancionou o projeto que cria a Política Municipal de Mobilidade Urbana Sustentável de Salvador, que estabelece diretrizes de políticas públicas para o setor de mobilidade da cidade. A decisão foi publicada na edição do Diário Oficial do Município desta sexta-feira (6), dois dias depois de a proposta ser aprovada, sob muita discussão, na Câmara de Vereadores.


O projeto, encaminhado pela Prefeitura ao legislativo, também institucionaliza as determinações do Plano de Mobilidade Urbana Sustentável de Salvador (PlanMob), que será regulamentado por decreto pelo prefeito ACM Neto -- ele tem prazo de 90 dias para isso. O plano, o primeiro da cidade, será instrumento de orientação das políticas públicas do setor de mobilidade, com diretrizes e ações para os próximos 32 anos -- até 2049, quando a capital baiana completará 500 anos.


A proposta causa muita discussão porque, enquanto a prefeitura diz que as medidas buscam uma melhoria da qualidade de vida e das condições para o desenvolvimento de Salvador, sustentando-se nos princípios de acessibilidade, segurança, eficiência e dinamismo econômico, os opositores afirmam que o projeto não foi amplamente divulgado e discutido com a população e que a implantação do plano por meio de decreto, e não via projeto de lei, "esvazia" o papel dos vereadores na fiscalização dos atos da Prefeitura, que terá autonomia para alterar, a qualquer momento, pontos do projeto.

Na Câmara, o plano teve 27 votos favoráveis dos 34 vereadores presentes na sessão, na quarta-feira (4). Os sete votos contrários foram de vereadores da oposição. Integrantes de movimentos sociais contra a aprovação do texto acompanharam a votação com cartazes e faixas com mensagens de protesto.


As diretrizes do projeto que institui a Política Municipal de Mobilidade Urbana Sustentável foram apresentadas aos vereadores pelo secretário de Mobilidade Urbana, Fábio Mota, no dia 17 de abril.

O projeto


Site foi criado pela prefeitura para que as pessoas possam conhecer e acompanhar as medidas. — Foto: Reprodução

O Plano de Mobilidade Urbana Sustentável de Salvador (PlanMob), diz a prefeitura, será instrumento para políticas públicas do setor de mobilidade, com o objetivo de contemplar propostas específicas no que diz respeito à mobilidade urbana, tratando de aspectos de micro e macro acessibilidade, envolvendo questões associadas a pedestres, ciclistas, circulação viária, segurança viária, transporte coletivo, interação entre uso de solo e transportes e organização institucional do setor.


Um site foi criado pelo executivo para que os cidadãos possam conhecer e acompanhar as medidas.


O plano abarca a construção de novas vias, principalmente na área do Centro da cidade, e soluções de pontos críticos de tráfego, bem como a implantação de novos equipamentos para o transporte vertical, como planos inclinados, teleféricos e escadarias, para facilitar o deslocamento nas subidas de morros e de terrenos elevados.


O PlanMob tem metas para o ano de 2025, quando se dará a revisão do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU), para 2032, quando está previsto um pico demográfico na capital baiana, e para 2049, em referência ao marco histórico da fundação da cidade. Além disso, o projeto é uma meta do Plano Salvador 500, que pretende executar uma série de ações para o desenvolvimento da cidade ao completar 500 anos.


Atualmente, o sistema de mobilidade da capital conta com 703 linhas de transporte, envolvendo o Sistema de Coletivos de Salvador (STCO), o Subsistema Especial Complementar (STEC), os dispositivos verticais - planos inclinados e Elevador Lacerda -, serviços hidroviários, por meio de lanchas e ferry boat, trens e o sistema metroviário que, juntos, transportam cerca de 1,2 milhão de passageiros diariamente.


A prefeitura ainda não divulgou detalhes de cada obra a ser executada: locais, prazos e valores. O secretário Fábio Mota disse, nesta sexta, ao G1, que a expectativa é que essas informações sejam divulgadas a partir da segunda-feira (9), no Diário Oficial.


Três vertentes foram consideradas para balizar a produção do PlanMob: transporte coletivo, transporte individual e transporte ativo, que também é chamado de não motorizado. A ideia, segundo a prefeitura, é priorizar o transporte coletivo e melhorar a qualidade e o tratamento da cidade em relação ao transporte a pé e para bicicletas, além de promover intervenções viárias no intuito de melhorar a fluidez do trânsito.


O plano prevê ligação das obras com projetos que já estão em andamento, conforme a prefeitura, a exemplo do reordenamento do sistema de transporte na cidade, considerando a existência de metrô, do VLT (Veículo Leve Sobre Trilhos) do Subúrbio e do polêmico Bus Rapid Transit (BRT).


Plano prevê ligação das obras com projetos como o BRT. — Foto: Divulgação

Com obras iniciadas no dia 29 de março, o BRT tem provocado discussão, com protestos feitos por ambientalistas, urbanistas, moradores e artistas. Manifestantes dizem que a implantação do sistema causa a derrubada de árvores e o tamponamento de rios. A prefeitura, no entanto, alega que o projeto já prevê a compensação por árvores retiradas.


O Ministério Público Federal na Bahia (MPF/BA) e o Ministério Público do Estado da Bahia (MP/BA) pediram declaração de nulidade do contrato firmado entre a prefeitura de Salvador e o Consórcio BRT/Salvador e, liminarmente, a suspensão imediata das obras do BRT na capital baiana. Os órgãos dizem que ajuizaram ação civil porque o empreendimento descumpre inúmeras exigências legais, entre elas ausência de participação da população e de Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA).


O VLT, por sua vez, que irá substituir o atual Trem do Subúrbio e terá 19,9 km de extensão, com 22 estações e capacidade para transportar cerca de 200 mil usuários por dia, ainda não saiu do papel. Em maio, foi anunciado o consórcio, formado por 2 empresas, que venceu licitação para implantação e operação do sistema. As obras devem ser iniciadas em outubro, cerca de 90 dias após a assinatura do contrato.


Grupo protestou durante votação de projeto na Câmara de Vereadores de Salvador — Foto: Reprodução/TV Bahia

Estudos

Conforme a prefeitura, o PlanMob foi elaborado a partir de estudos baseados na Lei Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo (Louos) e o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU), ambos aprovados em 2016.


A elaboração do plano, diz a prefeitura, atende às exigências, objetivos e diretrizes estabelecidas na Lei Federal nº 12.587/2012, conhecida como Lei da Mobilidade Urbana, que determina que as cidades com mais de 20 mil habitantes e que sejam obrigadas a elaborar um Plano Diretor também criem um Plano de Mobilidade Urbana.


A lei nacional institui como diretrizes a integração entre modais, a prioridade aos meios de transporte coletivo e os não motorizados, além de questões voltadas à acessibilidade universal.


Um diagnóstico de todo o sistema de deslocamento urbano da capital baiana foi elaborado pela empresa TTC Engenharia, a pedido da prefeitura, a partir de análises de documentos, estudos, pesquisas e escutas setoriais, que traçaram um perfil do setor na cidade, observando fatores como topografia, conectividade viária, modais de transporte, ocupação desordenada e renda familiar da população.


O relatório, diz a prefeitura, traça o perfil da mobilidade urbana de Salvador desde a década 1940, levando em conta o fato de a cidade estar dividida em dois planos básicos: Cidade Baixa e Cidade Alta. Além disso, no texto foram abordados aspectos como a ocupação desordenada, a explosão populacional na capital que, neste período, segundo o levantamento, cresceu cerca de 500 mil habitantes a cada dez anos -- o equivalente à população atual de um município como Feira de Santana, a 100 km da capital.


Dentre os dados divulgados no relatório consta a queda de 17% nas viagens via transporte coletivo entre os anos de 2012 e 2017. Em contrapartida, o estudo aponta para o crescimento de 22% nos deslocamentos em veículos privados, no mesmo período, o que, segundo a prefeitura, é considerado ruim para o desempenho de mobilidade da cidade.


Em 1995, conforme o levantamento, 44 milhões de passageiros foram transportados pelos coletivos da capital. Em 2012 este número caiu para 36 milhões, chegando a 34 milhões no ano passado. Com isso, o executivo pensou com o plano em ações para priorizar o transporte não motorizado e o transporte coletivo.


Ainda conforme o relatório, o ponto de maior concentração de veículos/passageiros da capital ainda é a BR-324, com cerca de 4 mil automóveis circulando diariamente. O estudo contempla até mesmo as pessoas que se utilizam dos equipamentos básicos de mobilidade, como calçadas, acessos às estações de transbordo, pontos de ônibus e ascensores que, juntos, somam 1,7 milhão de pedestres circulando todos os dias.


Segundo a Semob, o PanMob levará em conta ainda o tempo de deslocamento da população dos bairros mais distantes e a questão da segurança.


A prefeitura destaca como "contribuições do PlanMob Salvador" a atualização da base dados da mobilidade, a consolidação do acervo de planos, estudos e projetos existentes de 1975 a 2017, na área de transportes da cidade e Região Metropolitana de Salvador, a proposta de rede única multimodal e integrada de transporte através da integração dos diversos modais rodoviários, ferroviários, hidroviários, não-motorizados e verticais da cidade numa rede única.


"A partir da pesquisa que traçou a síntese da mobilidade em Salvador, apresentamos diagnóstico, prognóstico e começamos a desenvolver diretrizes do setor, apontando metas para 2025, para 2032 e 2049", disse o diretor de Planejamento de Mobilidade da Semob, Eduardo Leite.

Alvo de muita discussão, projeto foi aprovado na Câmara de Salvador — Foto: Reprodução/TV Bahia

Debate

Líder da oposição na Câmara de Salvador, a vereadora Marta Rodrigues diz que o projeto não foi debatido amplamente com a população e que nenhuma emenda proposta antes da votação do projeto na casa foi aceita. Critica ainda a decisão da prefeitura de regulamentar via decreto o plano pelo prefeito ACM Neto.


"A população não foi escutada, e sabemos que o princípio básico para fazer uma política como essa é um amplo debate. Além de ouvir a população, é preciso ainda incorporar o que vem de sugestão da própria população e isso não aconteceu. Nenhuma das emendas apresentadas foi incorporada. Outra coisa é que o PDDU diz que a política de mobilidade tem que ser por projeto de lei e não via decreto. Se daqui há um ano ou dois, por exemplo, o prefeito decidir mexer, ele mexe, sem precisar consultar os vereadores. Se fosse via projeto de lei, qualquer alteração teria que mandar antes para a câmara debater e avaliar", destaca.


O vereador Henrique Carballal (PV), líder do bloco governista, discorda e destaca a importância da proposta para a mobilidade urbana de Salvador.


“A nossa bancada sabe exatamente o que votou. Todo discurso da oposição é falacioso. Inúmeras audiências públicas foram realizadas para debater com a sociedade civil. Futuramente, podem haver algumas alterações por decreto, mas sempre respeitando o que foi aprovado por esta Casa”, afirmou.


O secretário de Mobilidade Urbana de Salvador, Fábio Mota, também diz que a proposta foi discutida com a população. "Foram realizadas 27 escutas setoriais, que é quando chamamos as entidades de classes, de conselhos e sociedade civil para discutir a mobilidade. Fizemos oficinas em todas as prefeituras-bairros. Além disso, houve seis debates nas principais universidades de Salvador e quatro audiências públicas, sendo duas no MP [Ministério Público]. Então, houve, sim, um debate amplo com a sociedade", destacou.


O secretário ainda disse que a implantação do projeto via decreto é para não "engessar" as propostas e que a medida foi tomada também em outros estados. "São Paulo e Rio de Janeiro implantaram via decreto. Quando não ocorre dessa forma, a coisa fica engessada. A mobilidade é uma coisa dinâmica, às vezes é preciso, com o tempo mudar uma coisa, tirar uma via de um lugar e colocar em outro. Se fosse via projeto de lei, iria ficar engessado porque qualquer coisa que precisasse ser feita teria que enviar proposta para a câmara, para ter votação e tal", disse.

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