O contrato homologado tem valor estimado de R$ 2,8 bilhões para construir o modal. Auditoria interna do TCE aponta 'adoção de preço superior à mediana dos preços das amostras sem justificativa adequada'. Por Matheus Caldas
Publicado no AratuOn
O Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE) pautou para a próxima quinta-feira (13/7) o julgamento do processo que pode culminar com a declaração de nulidade do contrato firmado com Skyrail Bahia para construção do VLT do Subúrbio, em Salvador por conta de irregularidades pontuadas num relatório do Ministério Público de Contas (MPC-BA).
O contrato homologado tem valor estimado de R$ 2,8 bilhões para construir o modal, substituto dos antigos trens do Subúrbio, desativados em fevereiro de 2021. Auditoria interna do TCE aponta “adoção de preço superior à mediana dos preços das amostras sem justificativa adequada”.
O relatório auditorial embasou o parecer do MPC, assinado no dia 25 de junho pelo procurador Maurício Caleffi. O documento sustenta haver “fortes indícios” de que decisões do Conselho Gestor do Programa de PPP beneficiaram o Consórcio Skyrail Bahia.
O documento indica que, no dia 24 de janiro de 2018, o conselho se reuniu. O ex-secretário da Casa Civil do governo Rui Costa (PT), Bruno Dauster, sugeriu que o edital do VLT fosse alterado para que não se restringisse à utilização de veículo sobre dois trilhos com objetivo de que o certame permitisse a apresentação de modais com outras tecnologias. A partir deste encontro, teve início o processo de mudança de concepção do VLT para o projeto do monotrilho.
Segundo relatos publicados na ata da reunião, o então presidente do conselho, o atual secretário da Fazenda Manoel Vitório, teria “destacado a preocupação técnica, alertando que se as alterações do projeto forem substanciais, seria necessária a realização de nova consulta e audiência pública”.
Diante deste cenário, os conselheiros concordaram que houvesse estudos para avaliar a viabilidade para um modal de dois trilhos, ou monotrilho, ou qualquer outra tecnologia, com intuito de sustentar a republicação do edital de concorrência, divulgado cinco dias depois.
No dia 26, portanto dois dias depois, a Companhia de Transportes do Estado da Bahia (CTB) apresentou nota técnica emitida cerca de 24 horas após a reunião do Conselho Gestor.
“A nota técnica não indicou, de modo taxativo, o monotrilho como modal equivalente ao VLT, mas, ao revés, durante a análise preliminar, evidenciou tratar-se de modais distintos, embora guardem algumas semelhanças. Por tal razão, inclusive, é consignado ao longo do documento que o monotrilho poderia ser uma alternativa a ser avaliada”, sugere trecho do parecer do órgão ministerial de contas.
Para os analistas do parquet de contas, a nota técnica “foi utilizada e interpretada de forma equivocada para atuar como suposto documento técnico que avalizaria a decisão do Conselho Gestor do Programa de PPP na pretensão de realizar mudanças substanciais no conteúdo originário do edital”.
O documento, que será analisado na próxima quinta pelos conselheiros do TCE, sustenta que “foram evidenciadas e comprovadas graves irregularidades que, ao serem consideradas em conjunto, maculam de forma insanável a licitação”.
Para os analistas, a falta de audiências públicas e discussões com a sociedade civil são problemas no processo. “O conteúdo e o objeto licitado, […] diferem substancialmente da proposta de modal que foi apresentada no ano de 2017 (a partir do edital publicado em 03/05/2017), sem que fosse, em decorrência desse fato, submetido novamente a consulta e audiência públicas, bem como a nova avaliação dos órgãos ambientais”, detalha o parecer.
Com as alterações autorizadas na republicação do edital, o projeto do VLT, terrestre, foi substituído pelo monotrilho, com estruturas elevadas, “cujas características construtivas impactam substancialmente na paisagem do contexto urbano ao seu redor”. Os auditores e analistas garantem que o modal tem “potencial de concorrer ou ofuscar construções e monumentos de relevante valor histórico/arquitetônico que estejam no seu entorno”.
Além destes pontos, o relatório da auditoria do TCE aponta ausência de licença ou de diretriz para o licenciamento ambiental e da inexistência da autorização da Assembleia Legislativa (AL-BA) para a concessão – desta forma, o MPC sugere que o Legislativo “adote as medidas legais que entender cabíveis” para os envolvidos no processo.
Os auditores da Corte de Contas baiana ainda entendem que houve desconsideração do patrimônio ferroviário na definição do preço de referência para a licitação. Os trens foram desativados após 161 anos de operação. Com a decisão do governo Rui Costa, o transporte público e a mobilidade do Subúrbio e da Cidade Baixa foi alterada.
Moradores, líderes comunitários e parlamentares reclamam que, com a desativação, os usuários passaram a pagar a tarifa do ônibus, atualmente em R$ 4,90, em vez dos R$ 0,50 cobrados pelo antigo sistema de trens da região.
CONCLUSÕES DO MPC
Além da nulidade do contrato, o órgão ministerial de contas propõe imposição de penalidade pecuniária ao chefe de Gabinete à época da Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado (Sedur), Fábio Lucena.
O parquet opina para que o TCE determine que a Sedur promova em até 180 dias a anulação do contrato celebrado com a Skyrail. A empresa, caso tribunal de contas assim entenda, terá que apresentar, em até 60 dias, os documentos apresentados na fase de habilitação e que não estavam legitimados pelo consulado da China, após de onde a empresa tem origem.
Na pauta da sessão, publicada na edição desta sexta-feira (7/7) do Diário Oficial do TCE, foram notificados o procurador-geral do Estado, Paulo Moreno, o ex-presidente do Desenbahia, Francisco Alfredo Miranda, e o presidente da Skyrail, Tie Li.
GOVERNADOR NA ESPERA
No último sábado (1/7), o governador Jerônimo Rodrigues (PT) admitiu ao portal Bahia Notícias a possibilidade de o governo do estado abrir uma nova licitação.
Na ocasião, ele falou sobre a reunião com a BYD na segunda-feira (3/7). A montadora vai instalar uma fábrica em Camaçari, na região Metropolitana de Salvador, e é um “plano B” para construção do empreendimento.
“A BYD vai estar aqui na segunda-feira, vamos fazer uma tratativa com eles sobre as informações que eles vão dar e sobre o VLT. Uma coisa é o seguinte, nós não vamos ficar aguardando daqui e dali. Vamos puxar e tomar uma decisão”, assegurou.
Em maio, a empresa e a gestão estadual admitiram a rediscussão do contrato, mas descartaram mudar a concepção de monotrilho do projeto.
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