Transporte público com tarifa zero é realidade em mais de 70 cidades brasileiras, mas só uma com mais de 300 mil habitantes. Por Juana Castro
Publicado no Aratu On
A gratuidade no transporte público de Salvador foi destaque em debate realizado pelo Observatório da Mobilidade Urbana de Salvador (ObMob) nesta terça-feira (6/6) em auditório da Universidade Federal da Bahia (UFBA) na capital baiana. Anunciado pelo Aratu On, o evento provocou discussão entre leitores. No Instagram do site, um usuário da rede social quis saber: “e quem paga a conta?”.
Para esclarecer dúvidas sobre o assunto, conversamos com o coordenador do ObMob, instituição privada sem fins lucrativos que pesquisa sobre transporte e segurança, Daniel Caribé. Autor de uma tese sobre gratuidade no transporte público, Caribé afirmou que o financiamento da tarifa zero pode vir de diversas fontes: a remodelação do vale-transporte, o orçamento municipal e a cobrança a donos de carros pelo uso das vias públicas.
Segundo o pesquisador, o transporte público gratuito é uma realidade em mais de 70 cidades brasileiras. Dessas, apenas uma tem mais de 300 mil habitantes, que é o município de Caucaia, no Ceará. Ainda de acordo com o coordenador do ObMob, seis capitais têm discutido a possibilidade de aplicar tarifa zero no transporte público, entre elas São Paulo e Distrito Federal.
Quem paga a conta?
Atualmente, apenas trabalhadores formais têm direito a vale-transporte. “Uma ampliação desse vale-transporte para todos os trabalhadores ou mais pode ampliar significativamente a fonte de receita do transporte coletivo e financiar parte do do sistema”, disse Caribé.
Outra possibilidade, afirmou o coordenador do Observatório, é que parte do financiamento venha dos orçamentos municipais. “A saúde é publica, a educação é pública e o transporte como direito social também pode ser público”, afirmou, pontuando que Salvador já financia parte do seu transporte coletivo.
Há, ainda, um debate sobre a cobrança de taxa do uso do espaço viário pelos proprietários dos veículos automotivos, o que se chama comumente de “pedágio urbano”. “Eu não sou muito simpático a essa alternativa, mas é uma proposta que existe”, avaliou.
Para Caribé, o mais importante, nesse momento, é que a prefeitura não seja a única responsável pela gestão de financiamento do transporte público. Dessa forma, é preciso envolver, também, os governos estadual e federal, como em outras políticas públicas.
“O metrô de Salvador, por exemplo, é parcialmente subsidiado pelo Governo do Estado, e a ideia é que isso se amplie, que os entes federais participem mais da gestão e do financiamento dos transportes coletivos, para que a gente possa, gradualmente, chegar a uma tarifa módica [mais acessível] ou até mesmo à tarifa zero”.
Obstáculos
Caribé cita o preconceito e a ignorância em relação ao transporte púlico e à tarifa zero como grandes obstáculos para avançar em um debate sobre o tema:
“As pessoas continuam achando que o que é gratuito é impossível de se alcançar; que o gratuito não presta, que vai ser vandalizado ou não terá boa qualidade. Quando, na prática, é exatamente isso que acontece hoje com o transporte coletivo. Que é ruim, precário, ineficiente, caro e não é público. Ou seja, a gente acaba não olhando para o que de fato acontece, enquanto a gente tem várias políticas públicas no país que mesmo com seus problemas, acontecem com um mínimo de efetividade”.
O pesquisador reforça que o importante é que a população tenha direito ao transporte público e, com isso, acesse outros direitos sociais, como saúde, educação, cultura, lazer e emprego. “A mobilidade é o meio para se alcançar outros direitos sociais“, refletiu o coordenador do ObMob.
SUM
Na visão dos ativistas que integram o coletivo, a constituição de um Sistema Único de Mobilidade (SUM) a exemplo do Sitema Único de Saúde (SUS) é um passo fundamental na mobilidade urbana. O SUM seria o alinhamento dos governos federal, estadual e municipal nas estratégias de transporte público. Só assim, para Caribé, seria possível viabilizar a “tarifa zero” e outras pautas de mobilidade urbana, como a acessibilidade para pessoas com deficiência. “Deixando isso apenas para as prefeituras não será possível avançar muito”, afirmou.
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